3 pontos de atenção no contrato de locação garantido por caução de bem imóvel
- Caroline de Andrade
- 8 de fev. de 2022
- 5 min de leitura
As espécies de garantia do contrato de locação estão restritas àquelas elencadas na Lei do Inquilinato, sendo a caução a primeira delas.
Como esclarecido no artigo anterior, podem ser ofertados para caução tanto bens móveis, como dinheiro ou um carro, quanto bens imóveis, que podem ser de propriedade do próprio locatário ou de terceiro.
Na hipótese de a preferência do locador ser pela caução de bem imóvel, vou apresentar neste artigo orientações sobre três pontos que requerem a atenção de quem administra a locação, sendo uma para cada fase do negócio.

Fase pré-contratual: análise da viabilidade da garantia
Ao receber a oferta de um imóvel como garantia do contrato de locação, o primeiro passo é analisar a sua documentação, fazendo uma boa due diligence da sua atual situação.
Esse imóvel está regularizado?
Quem é o atual proprietário? É quem o oferta em garantia?
Há gravames sobre esse imóvel?
Essas informações podem ser adquiridas através da certidão de inteiro teor do imóvel, que deve ser requisitada no Cartório de Registro de Imóveis competente de forma presencial ou online.
Se tudo estiver de acordo nessa primeira etapa, a segunda consiste na análise da situação do proprietário do imóvel a fim de investigar se o imóvel ofertado é o único no seu patrimônio e se ele se enquadra como bem de família.
E quais os requisitos para que se enquadre como bem de família?
O imóvel deve ser utilizado para residência do devedor, ou seja, deve ser sua moradia habitual, ou deve lhe gerar renda, que seja utilizada no custeio de sua moradia ou de sua manutenção.
A importância desta análise reside no fato de que, nos termos da Lei n. 8.009/90, o imóvel com caráter de bem de família é impenhorável, ainda que ofertado em garantia num contrato de locação.
Esse é o atual entendimento do nosso Supremo Tribunal de Justiça.
Veja a seguinte decisão:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO DA PARTE ADVERSA. INSURGÊNCIA RECURSAL DO AGRAVADO.
1. O escopo da Lei n. 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, mas sim a entidade familiar no seu conceito mais amplo, motivo pelo qual as hipóteses de exceção à impenhorabilidade do bem de família, em virtude do seu caráter excepcional, devem receber interpretação restritiva. Precedentes.
1.1. Consoante jurisprudência desta Corte, "em se tratando de caução oferecida em contrato de locação, não se aplica a exceção prevista no art. 3º, VII, da Lei 8.009/90. Caso o legislador desejasse afastar da regra da impenhorabilidade o imóvel residencial oferecido em caução o teria feito, assim como o fez no caso do imóvel dado em garantia hipotecária (art. 3º, V, da Lei 8.009/90)" (REsp 1873594/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/03/2021, DJe 04/03/2021).
2. O STJ firmou o entendimento no sentido de que o benefício conferido pela Lei n. 8.009/90 é norma cogente, que contém princípio de ordem pública, razão pela qual sua incidência somente pode ser afastada quando caracterizada alguma hipótese descrita no art. 3º da Lei n. 8.009/90. Logo, como regra, a renúncia das partes não é circunstância suficiente para afastar a proteção legal. Precedentes.
3. Contudo, verifica-se inviável deferir, de plano, a alegada impenhorabilidade, pois os requisitos para que o bem seja considerado de família não foram objeto de averiguação, sendo inviável proceder-se à aplicação do direito à espécie no âmbito desta Corte Superior por demandar o exame de fatos e provas, cuja análise compete, sob pena de supressão de instância, ao Tribunal de origem.
4. Agravo interno parcialmente provido tão somente a fim de determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que, diante do direito dos ora agravados à proteção conferida ao bem de família pela Lei n. 8.009/1990, proceda com o reexame do agravo de instrumento, analisando-se se o imóvel penhorado preenche os requisitos para se caracterizar como tal.
(AgInt no REsp 1789505/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 28/09/2021, DJe 01/10/2021)Portanto, seja criterioso ao avaliar o imóvel ofertado para não aceitar uma garantia vazia e, futuramente, ficar sem respaldo diante de eventual inadimplemento do locatário.
Fase contratual: redação da cláusula que trata da garantia
Um dos erros mais comuns na redação do contrato de locação é a inclusão de uma cláusula com a seguinte proposta: “o fiador Fulano de Tal dá em garantia à locação o imóvel X de sua propriedade”.
Veja que há duas garantias nesse contrato - uma fiança e uma caução de bem imóvel, o que configura dupla garantia e é proibido pela Lei do Inquilinato.
Além dessa violação, o que constatamos desses contratos é a existência de uma confusão entre as duas espécies de garantias locatícias.
E isso acontece, porque, na análise da capacidade econômica do fiador, é comum a exigência de que ele possua imóveis em seu nome, o que faz parecer que tais bens serão a garantia da locação.
No entanto, a fiança é uma garantia pessoal, ao contrário da caução de bem imóvel, que é uma garantia real.
O fiador responde sim com todo seu patrimônio pelos inadimplementos do locatário, o que não significa que ele não possa aliená-lo por completo durante a locação, fazendo com que, diante de uma futura ação de cobrança, não tenha recursos para quitá-la.
O que não ocorre quando a garantia é a caução de bem imóvel. Nela o bem responde diretamente pelas dívidas do locatário, ainda que tenha sido alienado a terceiros.
Assim, o locador poderá requerer a sua penhora e alienação forçada, independentemente de quem seja seu atual proprietário, satisfazendo seu crédito.
Portanto, não inclua no seu contrato de locação uma cláusula com a seguinte redação: “o fiador Fulano de Tal dá em garantia à locação o imóvel X de sua propriedade”. Escolha apenas uma das garantias.
Fase pós-contratual: eficácia da garantia contra terceiros
Para que a sua garantia tenha eficácia contra terceiros, que eventualmente venham a adquirir o imóvel, é indispensável que você averbe o contrato de locação na matrícula desse bem, no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Veja o que dispõe a Lei do Inquilinato:
Art. 38. A caução poderá ser em bens móveis ou imóveis.
§ 1º A caução em bens móveis deverá ser registrada em cartório de títulos e documentos; a em bens imóveis deverá ser averbada à margem da respectiva matrícula.Os custos dessa averbação podem ser repassados para o locatário, desde que haja previsão contratual nesse sentido. No entanto, será necessário consultar o Cartório para levantar os valores e compreender se o inquilino terá condições de arcar com eles. Lembre-se que não averbar, nesta modalidade de garantia, não é uma opção.
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